Conheci Akira Okui em um hostel no norte da Argentina. Ele vinha da Guatemala, com destino à Patagônia. Aproveitou pra me contar sua história, entre um pedaço de pizza e outro.
Nascido e criado em Quioto, capital do Japão durante o império, Akira seguiu as tradições e costumes de sua cultura até completar 18 anos.
“Eu era uma criança um pouco difícil para os meus pais por não querer seguir as regras que outras crianças seguiam”
Seguiu desobedecendo. Estudou comércio exterior e escolheu trabalhar em ONGs e projetos pelo mundo. Nos mais de 30 países que visitou, aprendeu francês, espanhol e inglês. Quanto mais conhecia o mundo, menos japonês se sentia.
Sua viagem mais marcante foi para Argélia, ex colônia francesa na África, onde trabalhou em um projeto de construção ao lado de outros japoneses. Diferente de seus colegas, Akira aproveitou a experiência para conhecer profundamente o país. Foi assim que ficou noivo de uma argelina, que é hoje sua ex. Com as dores do processo fez as malas e levou a tristeza da separação para conhecer o continente americano.
Na sociedade japonesa o coletivo é mais valorizado que a esfera individual. “O meu tempo e o meu espaço não valem mais que o dos outros” No Japão todos limpam as ruas, não se atropelam e os número dos casos de corrupção são os menores do mundo.
Tal educação também tem pontos negativos, para Akira, insuportáveis. Como seguir a maioria sem destacar sua personalidade, ser reservado e para ele o pior: Não estar feliz e não dizer.
“Eu já não posso trabalhar com outros japoneses, não posso seguir sempre esses valores por que eu sinto que sou diferente. Já não sou japonês típico”
Quando conheceu gente realmente pobre, vivendo com bom humor, alegria e criatividade pela América Latina foi quando se sentiu mais humano. Akira tem duas personalidades bem marcadas. Uma no Japão, quando visita sua família e outra que descobriu nesta viagem, neste continente, onde sente seu sangue correndo, corado, gritando. Nenhum de seus amigos faz a mesma coisa nem tem sonhos parecidos, mas Akira divide com eles também suas dificuldades.
A primeira é a falta de pontualidade. Hoje, já se acostumou com os atrasos mas segue chegando no horário. A segunda foi um prato típico do Equador “Pra mim é um pet, não consegui comê-lo”, sobre o cuí, nosso porquinho da Índia.
Perguntei para o viajante se ele aconselha seus amigos a fazerem o mesmo. Depois de instantes negou com a cabeça e disse:
“Viajar não é fácil, às vezes tem dificuldades” Eles precisam se perguntar o motivo de fazer isso, viajar requer imaginação.
Imaginar na diferença cultural e na bagagem dos outros. O porque de um reação, uma careta ou uma resposta atravessada requer tal atributo, um dom a ser desenvolvido na prática.
Depois de me deixar imaginando, curvou-se levemente agradecendo a entrevista, como se não fosse um favor dele para mim. Ao mesmo tempo, recebeu bem o meu abraço brasileiro.