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Karoro, o Kayapó que fala português

Tempo de leitura: 2 minutos

“Amor para mim fala Ipron, mas as mulheres dizem Apron.”

Em sua cultura, tanto faz quem se apaixona primeiro, mas para Karoro foi Ipron e Apron no mesmo instante.

Sua aldeia fica há algumas horas de São Félix do Xingu e quando criança brincava com uma kayapó no meio da mata virgem todos os dias. Estavam correndo quando um bicho perigoso, tipo uma aranha, caiu de uma árvore mudando a brincadeira. Ganhava quem pegasse primeiro e o empate rendeu duas picadas doloridas.

Já adulto, Karoro lembrou daquele dia em que choraram juntos e resolveu reencontrá-la. Conversaram e conversaram até o momento que ela se reapronxonou. Se casaram e hoje, seus netos brincam cada dia em uma floresta menos verde que a da história.

Sente muito orgulho de seus netos, pois em sua cultura são os avós que dão o nome verdadeiro de uma criança. Nome não, nomes: Karoro se chama YKARYRYDJAKRAX e um Kayapó normalmente tem uns 5 ou 6 desses.

Além da grande festa em que as crianças recebem seu nome verdadeiro, os Kayapós celebram o milho, o peixe, o aruanã, o tamanduá bandeira e o macaco com músicas, máscaras e suas pinturas típicas. Pensando em preservá-las, além dos pais ensinarem os filhos, seus costumes são matérias da escola.

Karoro foi um dos primeiros Kayapós a aprender português. Ele prestou muita atenção em tudo que um funcionário da FUNAI o ensinava e continuou praticando com um enfermeiro e com uma professora na aldeia.

Depois da nossa conversa, nosso “oi” era “mecrumê”, que significa “muito bom”. Mas nem sempre é muito bom, “tem muito jornalista que não sabe nem o que perguntar e que ainda escreve que a gente não tá trabalhando”, disse. Kayapó gosta de trabalhar e é do trabalho que alimenta sua família.

Bem diferente, segundo ele, dos brancos que operam grandes máquinas que fazem todo o trabalho. Kayapó planta mandioca, batata, banana, jarinu (abóbora), mamão, pesca e caça tatu, porco do mato, veado, anta e mutum. É disso que as famílias vivem e não do que compram no mercado.

O recado final de Karoro é que o brancos não estão respeitando os Kayapós e que os motivos são mato, terra e minério. “Querem colocar vaca e plantar fava, enquanto nós estamos aqui, no mato, sempre cuidando.” pediu para que eu acrescentasse que eles nunca brigaram com fazendeiro nem com minerador, que respeitam e querem respeito.

Raquel Cintra Pryzant
Raquel Cintra Pryzant
Raquel Cintra Pryzant é editora do portal de viagem e gastronomia Sola no mundo desde 2017. Com mestrado na Espanha e experiência internacional, já colaborou com veículos como National Geographic, BBC, CNN, Skyscanner e mais